quarta-feira, 25 de maio de 2011

O silêncio

In Silence - Chiharu Shiota

"Nós, os índios, conhecemos o silêncio. Não temos medo dele.
Na verdade, para nós ele é mais poderoso do que as palavras.
Nossos ancestrais foram educados nas maneiras do silêncio e eles
nos transmitiram esse conhecimento.
"Observa, escuta, e logo atua", nos diziam.
Esta é a maneira correta de viver.
Observa os animais para ver como cuidam se seus filhotes.
Observa os anciões para ver como se comportam.
Observa o homem branco para ver o que querem.
Sempre observa primeiro, com o coração e a mente quietos,
e então aprenderás.
Quanto tiveres observado o suficiente, então poderás atuar.
Com vocês, brancos, é o contrário. Vocês aprendem falando.
Dão prêmios às crianças que falam mais na escola.
Em suas festas, todos tratam de falar.
No trabalho estão sempre tendo reuniões
nas quais todos interrompem a todos,
e todos falam cinco, dez, cem vezes.
E chamam isso de "resolver um problema".
Quando estão numa habitação e há silêncio, ficam nervosos.
Precisam preencher o espaço com sons.
Então, falam compulsivamente, mesmo antes de saber o que vão dizer.
Vocês gostam de discutir.
Nem sequer permitem que o outro termine uma frase.
Sempre interrompem.
Para nós isso é muito desrespeitoso e muito estúpido, inclusive.
Se começas a falar, eu não vou te interromper.
Te escutarei.
Talvez deixe de escutá-lo se não gostar do que estás dizendo.
Mas não vou interromper-te.
Quando terminares, tomarei minha decisão sobre o que disseste,
mas não te direi se não estou de acordo, a menos que seja importante.
Do contrário, simplesmente ficarei calado e me afastarei.
Terás dito o que preciso saber.
Não há mais nada a dizer.
Mas isso não é suficiente para a maioria de vocês.
Deveríamos pensar nas suas palavras como se fossem sementes.
Deveriam plantá-las, e permiti-las crescer em silêncio.
Nossos ancestrais nos ensinaram que a terra está sempre nos falando,
e que devemos ficar em silêncio para escutá-la.
Existem muitas vozes além das nossas.
Muitas vozes.
Só vamos escutá-las em silêncio."

Kent Nerburn - "Neither Wolf nor Dog. On Forgotten Roads with an Indian Elder"

quarta-feira, 18 de maio de 2011

As queer as a clockwork orange


Da Wikipedia:
O Tratamento Ludovico é uma representação artística do fenômeno psicológico conhecido como condicionamento clássico, processo descrito pelo fisiólogo russo Ivan Pavlov. O processo envolve a apresentação repetitiva de um estímulo neutro, que não há reação no organismo, juntamente com algum outro estímulo excitador ou repressor, até que a associação seja construída. Na história [Laranja Mecânica], quando o tratamento é aplicado no protagonista Alex DeLarge, ele é estimulado a associar seu mal-estar à violência.

Das duas, uma: ou Burgess estava muito errado quando escreveu Laranja Mecânica, ou estava muito certo.

Se bem me lembro, eu vi o filme e li o livro, mas lembro mais do filme, já que aquelas expressões que o autor inventou acabam ficando muito chatas até o fim. O filme do Kubrick mostra um futuro em que um grupo de jovens pratica sexo e ultraviolência em doses mais ou menos iguais, regado pelo Moloko, um leite que dava barato, apesar da aparência inocente. Abordavam belas garotas, interessadas ou não, e batiam em velhinhos com bengaladas. Além de usarem roupas que deixariam a Gaga morrendo de inveja!


Alex deLarge, o líder, depois de tanto aprontar, é preso e submetido ao famigerado Tratamento Ludovico, que como explica a Wikipédia, apresentava uma sucessão de imagens de sexo e violência, que a princípio agradam Alex, mas depois acabam por deixá-lo perturbado, incomodado.

Ao final do tratamento, a sociedade vence! Alex está totalmente curado da maldição de seu ímpeto: castrado de seus instintos, ele mal consegue tocar uma moça nua, dignamente postada diante dele. Sente aversão até da sinfonia de que mais gostava, usada estrategicamente no tratamento.


Alex deLarge é o homem do século XXI. O homem sem ímpeto:
  • Politicamente correto
  • Avesso à violência 
  • Trabalhador
  • Liberto de seus instintos
  • Desmotivado ao sexo
  • Inerte
  • Receptivo a tudo que lhe é imposto
  • Recluso e temeroso
Humano?

domingo, 15 de maio de 2011

Fragmentos - Com base em "Bedtime Story", da Björk


Today is the last day that I'm using words
they've gone out, lost their meaning
don't function anymore
Já pensou que tudo que tomamos por realidade é uma grande codificação? 
Tudo codificado em palavras, signos sonoros e escritos... Luzes refletidas em determinadas frequências, as quais classificamos como cores... Percepções táteis, olfativas... Códigos que são "percebidos" pelo filtro dos nossos sentidos e traduzidos pelo cérebro, que dá significado a tudo isso.

Let's get unconscious honey
let's get unconscious
Então, como diz o Beakman, quando o consciente vai dormir, o inconsciente pode sair para brincar!













Travelling - leaving logic and reason
Travelling - to the arms of unconsciousness
Mas o chato é que, mesmo o inconsciente brincando e criando as mais absurdas histórias, ele ainda usa os mesmos significados do que é absorvido pelos sentidos. Sonhamos que estamos voando ou sendo atacados por aranhas gigantes porque o cérebro tem lá dentro a codificação do que é voar - ele sabe como é o voo, pelos pássaros, por exemplo, e aplica isso à gente; ele sabe o que é uma aranha, então muda sua escala, e ele sabe que isso nos assustaria, então temos medo no sonho. Mas e se não fosse assim?

Words are useless
especically sentences
they don't stand for anything
how could they explain how I feel
E se a codificação fosse outra?
E se nem fosse necessário codificação?
E se as palavras abrangessem muito mais que seu sentido?

Travelling travelling - I'm traveling
Travelling travelling - leaving logic and reason
Travelling travelling - I'm gonna relax
Travelling travelling - in the arms of unconsciousness
Qual é a função do silêncio? Qual é a função do vazio?
Há vazios que preenchem mais do que palavras.
Quem lê este texto pode não me conhecer, mas neste vazio do não-conhecimento, ele monta um quebra-cabeça de como eu seria, com base nas peças que tem, como o perfil aí do lado. Pode se aprofundar, e entrar no twitter, pegar mais pecinhas, e as outras que faltam são criações nossas, que colocamos para preencher o quadro. Fazemos isso o tempo todo. Tem uma frase ótima do Leonardo Boff que diz que "a cabeça pensa a partir de onde os pés pisam".


And inside we're all still wet
longing and yearning
how can I explain how I feel?
Tudo isso mediado por um complexo material biológico, interligado em si, de certa forma padronizado na espécie, mas nem sempre funcionando 100%. O próprio corpo pode alterar a mensagem. O aparato neurológico é astonishing!
E às vezes o nosso próprio idioma não dá conta do que estamos querendo dizer exatamente! 
Ou seja, as interferências no processo de comunicação são tantas que uma transmissão perfeita é praticamente um milagre. As consciências são diferentes, os conhecimentos de mundo idem. Individualidades.

and all that you've ever learned
try to forget
I'll never explain again